CFM se posiciona a favor do direito da mulher abortar até a 12ª semana de gestação
ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Da Redação - 21/03/2013 - 10h11
- Última Instância
O CFM (Conselho Federal de Medicina) e os 27 CRMs (conselhos regionais
de medicina) deliberaram, por maioria, posicionamento das entidades
componentes deste sistema, que representa 400 mil médicos brasileiros,
com respeito à ampliação dos excludentes de ilicitudes penais em caso de
interrupção da gestação. “É importante frisar que não se decidiu serem
os Conselhos de Medicina favoráveis ao aborto, mas, sim, à autonomia da
mulher e do médico. Neste sentido, as entidades médicas concordam com a
proposta ainda em análise no âmbito do Congresso Nacional”, esclareceu o
presidente do CFM, Roberto Luiz d’Avila. Segundo ele, os Conselhos de
Medicina são contrários ao aborto, que continua a ser crime.
Por maioria, os Conselhos de Medicina concordaram que a Reforma do
Código Penal, que ainda aguarda votação, deve afastar a ilicitude da
interrupção da gestação em uma das seguintes situações: quando “houver
risco à vida ou à saúde da gestante”; Se “a gravidez resultar de
violação da dignidade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de
reprodução assistida”; se for “comprovada a anencefalia ou quando o
feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida
independente, em ambos os casos atestado por dois médicos”; e se “por
vontade da gestante até a 12ª semana da gestação”.
Para chegar a este posicionamento, os Conselhos de Medicina se
debruçaram sobre o tema durante vários meses. Foram ouvidos
representantes de diferentes segmentos e analisados inúmeros estudos e
contribuições. Aspectos éticos e bioéticos; epidemiológicos e de saúde
pública; sociais; e jurídicos foram avaliados. Representantes de grupos
religiosos também foram chamados a colaborar, apresentando seu ponto de
vista. Este conjunto de contribuições levou ao posicionamento adotado.
Diante do exposto, o CFM e os 27 CRMs expressam o entendimento
alcançado, ressaltando que entendimentos distintos devem ser
respeitados, como se espera num Estado Democrático de Direito.
Espera-se, dessa forma, contribuir para o avanço desse debate no âmbito
do Congresso, de forma específica, e na sociedade, sempre com a
preocupação de qualificar o exercício da Medicina e melhorar a qualidade
da assistência em saúde oferecida aos brasileiros.
Este tema está sendo tratado no âmbito da Reforma do Código Penal
Brasileiro (PLS 236/2012), atualmente em tramitação no Congresso
Nacional. A decisão dos Conselhos de Medicina foi tomada por meio dos
representantes das entidades que participaram do I Encontro Nacional de
Conselhos de Medicina 2013, realizado de 6 a 8 de março, em Belém (PA).
As conclusões serão encaminhadas oportunamente à Comissão do Senado
responsável pela elaboração do projeto.
Pelo entendimento dos Conselhos, com a aprovação dos pontos propostos
pela Reforma do Código Penal não haverá a chamada descriminalização do
aborto. O que serão criadas são “causas excludentes de ilicitude”. Ou
seja, somente nas situações previstas no projeto em tramitação no
Congresso a interrupção da gestação não configurará crime. Atos
praticados fora desse escopo deverão ser penalizados.
Do ponto de vista ético, entendeu-se, por maioria, que os atuais
limites excludentes da ilicitude do aborto previstos no Código Penal de
1940, os quais vêm sendo respeitados pelas entidades médicas, são
incoerentes com compromissos humanísticos e humanitários, paradoxais à
responsabilidade social e aos tratados internacionais subscritos pelo
governo brasileiro.
Para os Conselhos, a rigidez dos princípios não deve ir de encontro às
suas finalidades. Neste sentido, deve-se ter em mente que a proteção ao
ser humano se destaca como apriorístico objetivos moral e ético. Tais
parâmetros não podem ser definidos a contento sem o auxílio dos
princípios da autonomia, que enseja reverência à pessoa, por suas
opiniões e crenças; da beneficência, no sentido de não causar dano,
extremar os benefícios e minimizar os riscos; da não maleficência; e da
justiça ou imparcialidade, na distribuição dos riscos e benefícios,
primando-se pela equidade.
Com relação aos aspectos epidemiológicos e de saúde pública,
concluiu-se que a prática de abortos não seguros (realizados por pessoas
sem treinamento, com o emprego de equipamentos perigosos ou em
instituições sem higiene) tem forte impacto sobre a Saúde Pública. No
Brasil, o abortamento é uma importante causa de mortalidade materna no
país, sendo evitável em 92% dos casos. Além disso, as complicações
causadas por este tipo de procedimento realizado de forma insegura
representam a terceira causa de ocupação dos leitos obstétricos no
Brasil. Em 2001, houve 243 mil internações na rede do SUS (Sistema Único
de Saúde) por curetagens pós-abortamento.
No campo social, levou-se em consideração as estatísticas de morbidade e
mortalidade da mulher em decorrência de práticas inseguras na
interrupção da gestação são ainda maiores devido à dificuldade de acesso
à assistência adequada, especialmente da parcela menos favorecida da
população. Na avaliação dos Conselhos, esse aspecto agrega a dimensão
social ao problema, que lança no limbo um segmento importante de
mulheres que acabam perdendo a vida ou comprometendo sua saúde por conta
de práticas sem o menor cuidado.
O Conselho esclarece que na esfera jurídica, a proposta de alteração do
Código Penal estabelecida no PLS 236/2012 - não irá descriminalizar o
aborto. A conclusão dos Conselhos de Medicina é de que com a aprovação
desse projeto o crime de aborto continuará a existir, apenas serão
criadas outras causas excludentes de ilicitude. Somente nas situações
previstas no projeto em tramitação no Congresso que a interrupção da
gestação não configurará crime.
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